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segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Band on the Run - Quando a Pressão Funciona!

   Na onda da 'Up and Coming Tour no Brasil, e do relançamento mundial em edições de luxo do famoso 'Band on the Run', sem dúvida um dos melhores trabalhos de sir Macca, reproduzo aqui este texto presente em meu livro 'Alto & Bom Som - Ruídos, Chiados e Pinceladas Musicais', publicado pela editora Barco a Vapor.

  
                                 
Depois de começar sua carreira-solo com o simples e caseiro álbum ‘McCartney’, Paul lançou outros trabalhos irregulares. Muito se esperava do álbum “Ram”, seu segundo trabalho solo, que frustrou as expectativas ao soar confuso e disperso.
Em 1971, Paul volta a fazer o que gosta – tocar com uma banda - ao montar o grupo Wings, mas lança dois álbuns fracos, “Wild Life” e “Red Rose Speedway”. Neste meio tempo, singles de sucesso como Live and Let Die e My Love mantinham a banda nas manchetes.

Em meados de 1973, Paul decidiu mudar de ares para a gravação do próximo álbum e pede uma lista de estúdios disponíveis ao redor do mundo à sua gravadora EMI. Em sua procura por um lugar para gravar, McCartney cogitou até o Rio de Janeiro, mas acabou optando por Lagos, na Nigéria.
Na véspera do embarque, os membros do Wings, Denny Seiwell (baterista) e Henry McCullough (guitarrista), simplesmente ligaram para Paul e disseram que não iriam viajar à Nigéria e estavam saindo da banda. Os dois músicos não estavam satisfeitos com o local da próxima gravação e também faziam restrições a participação de Linda no grupo.
 
O choque foi grande, mas Paul, acompanhado de Linda e do outro guitarrista Denny Laine, prosseguiu com os planos. A diferença foi que McCartney teria que assumir a bateria e fazer a maior parte dos solos de guitarra.
Paul esperava muito sol e um clima seco em Lagos, mas eles chegaram no meio das monções, e o tempo se tornou inclemente com chuvas torrenciais e intermináveis. Para complicar ainda mais, o estúdio da EMI não estava acabado, e Paul e os componentes da equipe tiveram que ajudar na sua montagem final.
Era difícil imaginar que McCartney conseguisse extrair música de qualidade naquela situação, mas o que se viu prova que Paul funciona melhor quando sob pressão.


A faixa-título que inicia os trabalhos é uma canção mágica, com constantes mudanças rítmicas, falando sobre uma banda em fuga. Segundo Paul, ele se inspirou nas frequentes discussões de negócio dos tempos difíceis da Apple, quando George Harrison comentava que “de alguma maneira, todos eram prisioneiros naquelas reuniões”.
 Band on the Run seria também lançada em single e atingiria o nº 1 nas paradas.
O poderoso rock Jet dá o tom a seguir com guitarras pesadas, tocadas por Paul e Denny, e uma sessão de metais muito forte. Esta canção seria sempre utilizada nas futuras turnês de Paul com o Wings e em carreira-solo, como forma de agitar a galera. Jet era ninguém menos do que um filhote de Labrador de Linda.
A acústica Bluebird acalma os ânimos e parece – com seus belos violões – uma prima direta da antiga balada Blackbird dos tempos do ‘White Album’. Destaque também para o solo de sax de Howie Casey.

Como se não bastasse todos os problemas, Paul ainda sofreu um mal súbito durante as gravações, chegando a desmaiar. Houve suspeitas até de um ataque cardíaco, mas o médico responsável acabou apenas recomendando que Paul descansasse e parasse de fumar.

Outro rock agitado de McCartney, Mrs. Vandebilt, mantém o pique do álbum, com belas guitarras, harmonias espertas de Linda e Denny e uma letra que tentava ser otimista, What’s the use of worrying? (por que se preocupar?), cantava Paul.
Mas na verdade, ele tinha muito com o que se preocupar. Uma noite após as gravações, Paul e Linda saíram para caminhar aproveitando uma trégua nas chuvas intermináveis. Durante o passeio eles foram abordados por uma gangue e ameaçados com facas. Os assaltantes levaram as fitas demos de tudo o que tinha sido gravado até então, para desespero dos McCartney. Felizmente, Paul lembrava de quase todo o material gravado, e o roubo não se mostrou determinante.

Para encerrar o lado 1, McCartney nos reservou uma de suas mais consistentes baladas, a inesquecível Let Me Roll It. Marcada por guitarras pesadas e um baixo muito consistente – Paul iria ganhar o prêmio de baixista do ano em 1974, de revistas especializadas – e ela também nos mostra um McCartney com todo o seu talento vocal, lembrando os tempos de Oh! Darling presente no disco “Abbey Road”. Paul utilizou muito o eco nesta gravação, o que fez com que muitos achassem sua voz parecida com a de John Lennon.

Gravada em meio a uma tempestade tropical, Mamunia, que significa ‘Porto Seguro’, inicia o lado 2 e parecia ser bem apropriada para a ocasião. Paul ainda estava tentando ser otimista com as chuvas e providencia uma bonita sessão de percussão na música.
O guitarrista Denny Laine, que viria a se tornar um membro importante até o final da banda, estreia como parceiro de McCartney na inofensiva No Words, o momento mais pop do álbum, em que Denny divide os vocais com Paul e Linda.
A faixa seguinte, Helen Wheels, na qual Paul ‘homenageia’ sua Land Rover, havia sido lançada em single, e Paul não a queria no disco, mas para os americanos, a inclusão de singles nos discos, significam grandes vendas de álbuns.  Nas edições inglesas e brasileiras originais, esta música não consta, sendo lançada apenas na América.

Os problemas continuaram quando Paul foi acusado por alguns músicos locais de estar “roubando os ritmos nigerianos”, sendo obrigado a lhes mostrar as gravações e prometendo que, se houvesse o ‘roubo’ desses ritmos, ele jogaria tudo no lixo. Ele foi absolvido pelos músicos!

A canção seguinte, Picasso’s Last Words ( Drink to Me), foi gravada no estúdio ARC de Ginger Baker, ex-Cream, que se encontrava na Nigéria e tocou percussão na música. Uma das mais criativas canções do álbum, ela foi composta durante férias de Paul na Jamaica alguns meses antes, quando ele encontrou o ator Dustin Hoffman que estava participando do filme “Papillon”.
Hoffman convidou os McCartney para jantar em sua casa e, durante a refeição, perguntou a Paul como ele fazia para compor. Qual o seu método? Não sabendo como explicar ao amigo, Paul apanhou o jornal do dia no qual havia uma notícia sobre a morte do famoso pintor Pablo Picasso, dando conta que suas últimas palavras haviam sido “Drink to me, drink to my health’ (Bebam à minha saúde). McCartney, de posse dessa frase, começou a dedilhar o violão e a composição foi ganhando forma na frente de um extasiado Hoffman que gritava para sua esposa, “Ele está compondo, veja, ele está compondo”.
O álbum chega ao fim com um piano muito competente tocado por Paul, na cativante Nighteen Hundred and Eigthy-Five, um desfecho sensacional para um álbum fantástico. Ao final da canção ouve-se o retorno do tema da banda em fuga, num arranjo primoroso do maestro Tony Visconti, que ganharia um Grammy por esse trabalho. 


Impossível não se destacar a capa do álbum. Paul teve a ideia de chamar alguns amigos e ídolos para uma foto, tendo como tema um grupo de pessoas fugindo. Muitos encontraram semelhança com a capa de Sgt. Pepper’s, mas tudo foi pura improvisação.
Fazem parte da foto da capa o ator James Coburn – na época lançando o filme “Pat Garret & Billy The Kid” de Sam Peckinpah - o jornalista e âncora de TV Michael Parkinson, o boxeador e futuro campeão mundial John Conteh, os também atores Christopher Lee (Drácula) e Kenny Linch e o colunista e gourmet Clement Freud, além de Paul, Linda e Denny. Eles foram clicados por Clive Arrowsmith.

Quando foi lançado, em dezembro de 1973, “Band on the Run” fez imenso sucesso e restabeleceu a credibilidade de Paul McCartney como músico e compositor. 
Ele estava pronto para novos desafios!

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