Falando de
literatura, meu gosto pessoal vai desde biografias, até relatos de aventuras
vividas por exploradores, navegadores e aventureiros.
Dentre meus
heróis, tenho que citar ao menos Sir Ernest Shackleton, um inglês que no início do século
XX protagonizou aventuras inesquecíveis no Pólo Sul.
Um de seus maiores feitos, foi conseguir salvar
toda sua tripulação, após o navio em que se encontravam ficar preso no gelo da
Antártida.
Lembro também de
Robert Falcon Scott, que perdeu a corrida ao Pólo Sul para Roald Amundsen e
morreu com seus companheiros na viagem de volta do Pólo. Uma tragédia que sacudiu a Grã-Bretanha!
Sempre me
interessei também por escaladas, e em 1997 topei com um livro de um tal de Jon
Krakauer.
Krakauer era um alpinista aventureiro e solitário. Ele já havia
escrito para várias publicações, entre elas a National Geographic, além de ser editor da ‘Outside’.
O livro se
chamava ‘No Ar Rarefeito’ (Into Thin Air) e Jon contava sobre as equipes comerciais que enfrentaram o monte Everest na
temporada de escaladas de maio de 1996.
Naquele ano, duas
grandes equipes comerciais escalaram o Everest no mesmo dia. Krakauer, era
financiado por uma publicação (Outside) para cobrir o evento, e escalou com a equipe do
neozelandês Rob Hall.
A outra equipe
era liderada pelo experiente alpinista americano Scott Fischer. Ambas tinham
além de guias e alpinistas tarimbados, pessoas que pagaram para escalar.
Algumas com pouquíssima experiência, outras, sem o preparo físico adequado.
Diga-se de passagem que o Everest é o pico mais alto do planeta, com seus 8.848 metros.
Durante o ataque
final ao cume, com as duas equipes subindo juntas, além de escaladores solitários encontrados no caminho, houve um congestionamento de
alpinistas na rota para o pico, atrasando a escalada.
Se o clima
continuasse bom, o que não era provável pelo atraso, devido ao grande número de escaladores, e ao adiantado da hora, talvez tudo
tivesse dado certo. Mas o tempo, como sempre, era imprevisível no Everest.
Na chamada ‘zona da morte’, acima dos 7.500 metros de
altura, as duas equipes foram surpreendidas por uma tempestade.
O dia se
transformou em noite, com a visibilidade caindo para 1 metro em todas as
direções e ventos fortíssimos. Alguns poucos precavidos, prevendo as dificuldades de uma
escalada lenta e sentindo os efeitos da altitude, deram meia volta pouco antes
da tempestade chegar. Outros, como Krakauer, foram os primeiros da fila, e conseguiram
chegar ao pico e voltar para suas barracas no Cume Sul já com o tempo piorando.
Irônicamente, os
dois líderes das expedições, Hall e Fischer, ficaram presos próximos ao cume do
Everest. Seus corpos congelados seriam encontrados dias depois. Além deles,
outros seis alpinistas perderam a vida, incluindo alguns dos clientes das
equipes.
O livro de
Krakauer me chamou a atenção por ele tentar achar as causas da tragédia e o que
levou aquelas pessoas a tentar subir a
qualquer preço ao teto do mundo, quando o mais sensato seria dar meia-volta e
aguardar outra oportunidade. A atividade de equipes comerciais no Everest
sofreria um duro golpe com o ocorrido em 1996.
Como Krakauer fez
muito sucesso por estas paragens,a editora resolveu publicar aqui seus dois
livros anteriores,‘Sobre Homens e Montanhas’(Eiger Dreams) e ‘Na Natureza
Selvagem’(Into the Wild).
No segundo, Krakauer
conta a história de um rapaz cujo corpo foi encontrado dentro de um ônibus
abandonado que servia de alojamento para caçadores, numa trilha remota do
Alasca, em 1992.
Descobriu-se
depois que esse jovem se chamava Christopher McCandless, ex-universitário,
atleta de elite e filho de empresários bem sucedidos do ramo da engenharia
espacial.
Chris andava desaparecido desde que se formara na universidade. Seus pais vinham tentando localizá-lo, sem sucesso, com a ajuda de detetives particulares.
Chris andava desaparecido desde que se formara na universidade. Seus pais vinham tentando localizá-lo, sem sucesso, com a ajuda de detetives particulares.
Jon Krakauer fez
uma longa pesquisa sobre a vida pregressa de McCandless, e descobriu que ele
vinha vagando pelos EUA com uma mochila nas costas desde que se formara.
Ele abandonara
seu carro num deserto, queimara sua carteira de identidade e os poucos trocados
que tinha no bolso, além de doar toda sua poupança para entidades beneficentes.
Nas suas idas e
vindas, Chris trabalhara nas mais diversas ocupações - incluindo na Macdonalds - ganhando apenas o
suficiente para de novo colocar a mochila e continuar suas andanças.
Entre outras
aventuras, McCandless atravessou os EUA de costa à costa, chegou ao Golfo do
México num caiaque e retornou clandestinamente para seu país.
Todos que foram
entrevistados por Krakauer contaram sobre um rapaz muito alegre, que
adorava a sensação de liberdade, que
desprezava o sistema e que desejava mais do que tudo enfrentar seu maior
desafio: viver algum tempo sózinho no mato selvagem!
McCandless tinha
facilidade para fazer amigos, mas era o tipo de pessoa que não suportava ficar
muito tempo rodeado de gente. Após uma estadia de algumas semanas em uma
cidade, ele sentia necessidade de se embrenhar em outra floresta, curtir a
natureza ou simplesmente pegar carona para lugar nenhum.
Foi dessa maneira,
pegando caronas, que ele chegou ao norte em abril de 1992. Fairbanks, no Alasca,
foi sua última parada e derradeiro contato com a civilização.
Na cidade,
aproveitou para comprar um rifle, um livro sobre plantas comestíveis, colocar 3
quilos de arroz e um par de botas - que ganhou de um amigo que lhe deu carona,
- na mochila, ao lado de seus livros de
Thoreau, Jack London e outros
escritores dessa mesma escola e sumiu de vista.
Chris estava com
o kit mínimo para sobreviver no mato. Além de uma barraca, do rifle e de um
mapa, ele não tinha mais nada. Estava totalmente por sua conta.
“Jack London é
rei”, escreveu Chris num pedaço de madeira, aliás, ele agora, penetrando no seu
maior desafio, não se chamava mais Chris McCandless. O nome que adotou dali em
diante seria Alex Supertramp.
E, como London diria: “A floresta escura de abetos erguia-se carrancuda de ambos os lados do rio congelado.”
E, como London diria: “A floresta escura de abetos erguia-se carrancuda de ambos os lados do rio congelado.”
Alex tomou o rumo
da sinistra ‘Stampede Trail’ (Trilha do Estouro da Boiada), após vadear um rio
que começava a descongelar.
Tendo chegado ainda em abril, além da neve derretendo, o caminho se encontrava lamacento e mais difícil de percorrer.
Tendo chegado ainda em abril, além da neve derretendo, o caminho se encontrava lamacento e mais difícil de percorrer.
Após 3 dias de
dura caminhada, ele dá de cara com um ônibus abandonado junto a uma clareira. O
veículo quebrara e fora deixado lá, anos atrás, para servir de abrigo a algum caçador que talvez só desse ás caras no
verão.
Alex adorou a aparição
do ônibus. Ele o chamou de ‘Ônibus Mágico’ - , quem sabe ele também não seria um
fã dos Beatles? – e se instalou o mais confortavelmente que conseguiu.
Enquanto isso, Tolstoi
era uma boa companhia: “Eu queria movimento e não um curso calmo de existência.
Queria excitação e perigo e a oportunidade de sacrificar-me por meu amor.”
Nas caçadas, quando
tinha sorte, Alex apanhava galos silvestres e lebres. Mas a caça não era
abundante. Ele complementava sua dieta com raízes de ervilha silvestre e mais adiante com
batata silvestre.
No livro sobre
plantas que levava, Alex estudava cuidadosamente quais eram comestíveis.
Num dia
particularmente bom, ele conseguiu caçar um alce. Infelizmente, ele não estava
preparado para uma caça tão grande. Suas tentativas de defumação da carne não
surtiram efeito, e ele foi obrigado a abandonar a carcaça aos lobos. Isso o
deixou terrivelmente deprimido. Alex não admitia desperdiçar a vida animal.
Nas semanas que
se passaram, Alex foi em frente em direção ao oeste. Acampou, teve pouca sorte
na caça e um soturno London lhe dizia:
“Um vasto silêncio reinava sobre a terra. A própria terra era uma desolação, sem vida, sem movimento, tão solitária e fria que seu espírito não era nem mesmo o da tristeza.”
“Um vasto silêncio reinava sobre a terra. A própria terra era uma desolação, sem vida, sem movimento, tão solitária e fria que seu espírito não era nem mesmo o da tristeza.”
Ele resolveu
voltar para o ônibus!
Ao que parece, 3
meses na natureza selvagem havia sido o suficente para Alex. Ele decidiu tomar
o rumo da civilização. Empacotou seus livros na mochila, e deixou para trás sua
aventura. Mas ele havia esquecido um detalhe.
Quando chegou ao
rio que havia atravessado em abril ele foi obrigado a parar. O degelo aumentara
consideravelmente a vazão das águas. O rio calmo virara um turbilhão
intransponível. Não havia como atravessar.
Alex deve ter analisado todas as suas
possibilidades e decidiu dar meia volta e seguir novamente para o ônibus. Certamente
chegou a conclusão que poderia aguardar que as águas baixassem no outono e
então poderia tentar novamente.
Em julho,
instalado novamente no ônibus, a sua sorte começou a mudar. A caça se tornava
mais escassa e ele apelava mais e mais para as plantas.
A carne com que se alimentava não era suficiente para repor suas necessidades calóricas e Alex foi ficando desnutrido.
Certo dia ele
acordou sentindo-se tonto e não conseguiu sair para caçar. Seu estado físico piorou
bruscamente e de maneira alarmante. Sem caça, ele necessitava mais das plantas,
e esta falta de opções acabou se revelando fatal.
No livro que lera
sobre as plantas comestíveis, Alex descobrira várias espécies que poderiam ser
ingeridas normalmente sem causar problemas.
Porém uma planta especificamente, a batata silvestre com que Alex havia se alimentado não era totalmente inofensiva.
Porém uma planta especificamente, a batata silvestre com que Alex havia se alimentado não era totalmente inofensiva.
Suas raízes
poderiam ser aproveitadas para a alimentação, mas suas sementes continham uma
substância tóxica. O livro não fazia menção às sementes, e Alex as ingeria
seguidamente.
O erro teve um
efeito devastador no seu corpo já debilitado pela falta de proteínas.
Alex, agora
estava lutando por sua vida.
Ele escrevia
bilhetes pedindo ajuda e deixava no ônibus, para o caso de alguém aparecer, enquanto se arrastava
em caçadas que não tinham resultado.
Assustado, ele voltou a se
chamar Chris McCandless!
O fim veio
rápido!
Em agosto ele já não conseguia manter-se em pé.
Acomodou-se no seu ônibus mágico e leu suas
últimas linhas, um poema de Robinson Jeffers:
“A morte é uma calhandra feroz; mas morrer
tendo feito
Alguma coisa mais
à altura dos séculos
Do que músculo e
ossos é principalmente não deixar passar fraqueza.
As montanhas são
pedra morta, as pessoas
Admiram ou odeiam
sua estatura, sua quietude insolente,
As montanhas não
são amolecidas ou perturbadas
E os pensamentos
de alguns homens mortos têm a mesma têmpera.”
3 comentários:
Parabéns pelo texto! Gostei bastante, principalmente desta última história, um resumo emocionante que não tirou a graça de ler o livro, e sim, despertou o interesse em conhecer mais detalhes da história. To acompanhando...
Alice, que bom que está vendo algo de bom por aqui! Abraço.
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