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terça-feira, 16 de novembro de 2010

Uma Bandinha de Garagem!

                          

Em 18 de julho de 1974, um sábado, o ex-Beatle John Lennon descansava à beira da piscina na mansão de sua propriedade em Los Angeles. John estava acompanhado de sua secretária e namorada na época, May Pang.
 Ele curtia a fase do famoso ‘Lost Weekend’, em que resolvera dar um tempo em Yoko Ono. Outras companhias naquela tarde agradável, incluíam os chapas Keith Moon, Eric Clapton e Ringo Starr de férias na cidade.
Ás 4 horas da tarde, chegam de surpresa Paul e Linda McCartney, que se preparavam para gravar com sua banda Wings em New Orleans, o álbum que ficaria conhecido como ‘Venus and Mars’, e, de passagem por L.A. decidiram visitar os amigos.


George Harrison, que também se encontrava na California em meio a sua turnê americana daquele verão, recebe um telefonema de Ringo e de guitarra em punho parte para a casa de Lennon.
Pela primeira vez reunidos desde 1969, e com a companhia de velhos amigos, os ex-Beatles, foram curtindo a tarde cheia de recordações dos velhos tempos.

Depois de alguns goles de tequila, o som começou a rolar! John correu pra varanda da casa e colocou pra tocar seu álbum recém lançado ‘Walls and Bridges’, escondendo sorrateiramente atrás da prateleira uma cópia do ‘Band on the Run’ de Paul, que ele costumava ouvir quando ficava deprimido.
Ringo Starr era só sorrisos, saboreando o imenso sucesso de seu último trabalho, ‘Ringo’ de 1973, e, claro, também havia uma cópia de seu disco, que foi o próximo a ser curtido.
Harrison, além da guitarra trouxe umas fitas demo do álbum que estava gravando antes da turnê, e também quis a opinião de seus parceiros sobre elas. Ele havia criado sua própria gravadora, a ‘Dark Horse Records’, e este era o título provisório de seu novo álbum a ser lançado até o final do ano.
Todos os discos e fitas foram ouvidos exaustivamente! 
Nesse clima de camaradagem, e de ‘vamos fazer um som juntos’, os amigos  resolveram montar a bateria de Ringo na garagem bastante espaçosa.

McCartney na época andava tocando na sua banda com um baixo Rickenbaker, que convenientemente ele deixava sempre no carro. George trouxe uma Fender, e John correu para buscar sua Epiphone Casino  para relembrar os velhos tempos.
Clapton que veio de Miami para descansar das gravações do álbum ‘461 Ocean Boulevard’, não teve outra alternativa e foi procurar uma guitarra, encontrando uma Gibson Les Paul no quarto de John. O ‘maluco’ Keith Moon conseguiu até achar um pandeiro.
Em meio aquela deliciosa desordem, havia dois microfones estilo ‘anos 50’ prontos para serem usados e amplificadores Vox por todo o lado.
Estava assim montada uma bandinha de garagem pra ninguém botar defeito.

O agito todo começou com uma ‘jam session’ lá pelas 11 horas da noite.
Como testemunhas, além de May Pang e Linda McCartney, estavam presentes o incansável roadie Mal Evans e o cantor Harry Nilsson que fazia uma pausa nas gravações de ‘Pussycats’, álbum que estava sendo produzido por Lennon.



A primeira música que eles fizeram questão de tocar pra valer, foi ‘Rock’n’Roll Music’, uma homenagem à música negra americana e a Chuck Berry em particular. John assumiu os vocais como no álbum ‘Beatles for Sale’, e a coisa pegou fogo. Pra enlouquecer o clima ainda mais, Eric e George capricharam no acompanhamento pra substituir o piano da gravação original.
A primeira canção gravada oficialmente em single pelos Beatles veio a seguir, e neste momento Ringo assumiu os vocais de ‘Love Me Do’, deixando Paul com o backing vocal. Quando eles se deram conta, Lennon não estava mais na garagem, voltando correndo minutos depois, com uma gaitinha de boca pro solo da música. Foi, literalmente, de arrepiar!
A ênfase toda do divertimento  estava na 1ª fase da banda. Eles imaginavam estar em um daqueles clubinhos de Hamburgo, na Alemanha, tocando rock pauleira. Era praticamente o punk em seu estágio primário.
 Alguém lembrou dos vizinhos... Eles deveriam estar imaginando o porquê de toda aquela zoeira! Mal Evans resolveu abrir o portão da residência, para averiguar, e, quando se deu conta, metade das pessoas da quadra havia invadido o enorme pátio da mansão.
Agora eles tinham audiência!!

‘Twist and Shout’, quem não lembra dela? John a tomou como um desafio, para saber se ainda tinha gogó para tanto. Foi soberbo ouvir aqueles sons de guitarra tão familiares acompanhando o vocal visceral de Lennon. Os meninos capricharam nos detalhes, e o coro de George e Paul respondendo ao vocal de John estava afiadíssimo.
As meninas presentes pediram uma balada a Paul. Ele preferiu emendar o rockinho alegre de ‘All My Loving’, com um magistral acompanhamento de seu baixo e da guitarra esperta de George. A galera delirou!

Keith Moon empurrou Clapton para o microfone, meio contra a vontade do ‘guitar man’, e Eric então resolveu arriscar. Entre todas as canções que ele poderia tocar, ele escolheu uma que talvez não fosse a mais apropriada para a ocasião. Resolveu cantar ‘Layla’.
Esta música havia sido dedicada à esposa de George Harrison, Pattie, no início da década. Agora eles estavam separados e Pattie havia se mudado para a casa de Eric. Todos os presentes reconheceram imediatamente os primeiros acordes da guitarra de Clapton, e os olhares se voltaram para George.
Como para dizer ao amigo que aceitava a situação – aliás, George já namorava sua futura esposa Olivia – Harrison se aproximou de Clapton e cantou o refrão junto com ele. A reação dos amigos músicos foi de emoção, e a dos espectadores foi primeiro de perplexidade e depois de aplausos intermináveis.
A canção chega ao fim com um abraço emocionado dos dois grandes amigos.


Para não deixar a peteca cair, Ringo aproveitou para emendar uma versão de seu hit ‘Photograph’ acompanhado no vocal por George. Moon assumiu a batera e Ringo fez todo mundo dançar e se emocionar novamente.
 Inspirado por Ringo, Paul puxou a introdução de ‘With a Little Help From My Friends’ com seu baixo, e fez um dueto vocal com o baterista que teria ficado perfeito no ‘Sgt. Pepper’s’.
Com todos ligadíssimos, a banda passou a improvisar um medley, começando com ‘Foxy Lady’ de Hendrix, viajando por ‘Sunshine of Your Love’ do Cream e terminando com o rockão ‘Back in the USSR’.   

Em plena madrugada o som ainda rolava lindo, pesado e solto. Então, Paul comandou a bandinha nos acordes iniciais da música ‘Band on the Run’, carro- chefe de seu último álbum e imenso sucesso nas paradas. Esta canção mais do que apropriada para o momento foi seguida de versões animadíssimas de ‘Jet’ e ‘Live and Let Die’, uma legítima trilogia do rock de McCartney, momento em que a garagem chegou a tremer com o impacto sonoro.  

John muito receptivo aquela noite, quis manter o clima alto astral com uma deliciosa cover dos anos 50, a inesquecível ‘Blue Suede Shoes’, canção que na voz de Elvis Presley foi uma das maiores inspirações para sua carreira. A agitação toda virou bailinho do interior com essa sacada de Lennon.

Ninguém queria acabar com a festa, mas o dia estava amanhecendo. George então cochicou no ouvido de Clapton e ambos foram para dentro da casa de onde voltaram em seguida carregando dois violões de 12 cordas.
Os outros adivinharam logo o que George queria, e assim que os primeiros acordes de violão de ‘My Sweet Lord’ começaram, todos que estavam presentes se uniram a Harrison cantando este hino dos anos 70! 

Tudo terminou ali! Os privilegiados espectadores foram gentilmente convidados a se retirar – o que fizeram relutantemente - para que todos pudessem descansar. Quando todos foram embora, Linda, May Pang e Harry Nilsson se recolheram.

Os caras, ainda acompanhados por Mal Evans que havia preparado um ‘english tea’, se sentaram no chão da garagem, exaustos. Eles comentaram que nunca haviam curtido tanto tocarem juntos, e que talvez algum dia pudessem até vir a fazer algumas gravações. Tudo dependeria da agenda deles.

Eram 7 horas da manhã quando resolveram ir dormir. Nesse momento John se deu conta de que havia alguns fios que saíam da garagem, atravessavam o gramado e entravam em sua casa. Todos se entreolharam. Mal Evans sorriu. Sem que os outros soubessem, ele havia gravado toda a brincadeira. Os cabos desembocavam numa tape machine caseira de 4 canais de John. O que em outros tempos teria sido motivo de discussões entre eles, agora era comemorado. Quem sabe no futuro eles poderiam até lançar estas gravações ao vivo!*



*Mal Evans levou as fitas embora. Em 1976 ele seria assassinado em sua casa de Los Angeles. Atualmente ninguém sabe o paradeiro dessas gravações.

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