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sábado, 26 de novembro de 2011

I Me Mine!


              
 Há 10 anos o ex-Beatle George Harrison deixava o nosso 'material world'. Sua obra e seu estilo de tocar guitarra porém, continuam cada vez mais influentes. Aqui eu resumo um pouco do que foi a trajetória de um músico criativo, talentoso e espiritual.
  

                    George Harrison in the Material World  -  Música e Sensibilidade
 
Tido sempre como um rapaz tímido e introvertido, George era, ao contrário, para quem o conhecia bem, uma pessoa alegre e brincalhona.
O caçula dos Beatles, ganhou essa aura de ‘quieto’ graças a sua participação no filme ‘A Hard Day’s Night’ ( Os Reis do Ié Ié Ié ), em que cada um dos rapazes ficaria estigmatizado com uma personalidade distinta.
Harrison, foi considerado um garoto jovem demais pelo líder John Lennon assim que foi apresentado à banda trazido por Paul McCartney, mas logo demonstrou que como guitarrista não ficava devendo nada a ninguém.
Em um primeiro momento ele foi eclipsado pela constante disputa de poder entre Lennon e McCartney, além do que a dupla compunha junto, o que obrigou George a também tentar compor, sob pena de se ver relegado a um plano secundário dentro do conjunto.     
A partir de 65, George se firma como compositor e ganha espaço para pelo menos duas canções por álbum. São dessa época as primeiras grandes composições de Harrison, como ‘I Need You’ e ‘Taxman’.
Surge em Londres nessa época o músico indiano Ravi Shankar que viria a se tornar grande amigo de Harrison.
Nesse mesmo período, cansado de seu trabalho com os Beatles, ele procura algo que dê mais sentido a sua vida. George foi o primeiro dos rapazes a desejar o fim das exaustivas turnês da Beatlemania.
 Em janeiro de 66, George troca alianças com Pattie Boyd, ex-modelo, que ele conheceu nas filmagens de ‘A Hard Day’s Night’.


Depois de algum tempo visitando a Índia, onde aprendeu a tocar sitar com Shankar, George volta para as gravações dos Beatles com novas e revolucionárias ideias. A partir de 1966 pode-se sempre ouvir sons indianos nos álbuns da banda, mais notadamente nas canções de George.
Quando a revolução musical dos Beatles chegou ao auge com ‘Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band’, em 67, lá estava Harrison presente com uma canção em que nenhum de seus parceiros de banda participavam. Em ‘Within You Without You’, ouve-se apenas a voz inconfundível de George junto á um grupo composto por músicos indianos.
George Harrison ainda não estava satisfeito. Ele queria se descobrir como ser-humano. Queria saber o significado da vida. E, mais uma vez, ele lidera os companheiros na sua procura por um sentido espiritual para tudo o que estavam vivendo.
Após a morte do empresário Brian Epstein, que os havia descoberto, Harrison conseguiu convencer todos os Beatles a partir com suas famílias para Rishikesh, na Índia, onde fariam um curso de Meditação Transcendental com o  Maharishi Mahesh Yogi, que naquele tempo de procura por mentores espirituais, era o guru mais requisitado.
A experiência, apesar da desconfiança geral com o guru, foi proveitosa. George conseguiu aprender as bases da meditação, e esta prática o acompanharia pelo resto de sua vida.
Na volta aos estúdios de gravação, os bons tempos estavam começando a ficar distantes dos Beatles. Durante as gravações do ‘Álbum Branco’ em 1968, a discórdia começou a minar os esforços da banda.
Harrison vai se afastando progressivamente de seus companheiros, e pela primeira vez traz um convidado famoso para uma sessão da banda. Seu amigo Eric Clapton é o primeiro músico de renome a participar de uma música da banda e ter seu nome creditado. A canção chamada ‘While My Guitar Gently Weeps’, foi o melhor trabalho de George até então, e Clapton não deixou por menos, ao emendar um solo mágico de guitarra.
Apesar de todo o carisma da banda, no inicio de 69 em um projeto de volta as raízes liderado por McCartney, George se desentende de vez com seus colegas.
Já há algum tempo Harrison vinha suportando a liderança ditatorial de Paul nas gravações e nos projetos dos Beatles. Quando McCartney resolve criticar abertamente a maneira de George tocar a guitarra justamente num momento de filmagem, este explode e abandona as gravações.
George afasta-se por vários dias e resolve voltar apenas para terminar os trabalhos já iniciados. Depois de um show no telhado da Apple ficou-se com a impressão que nunca mais os Beatles tocariam juntos.
Para desmentir os céticos, e provar que eles ainda eram a maior banda do planeta, eles resolvem se despedir em grande estilo. O disco ‘Abbey Road’ gravado em 1969, é sem dúvida nenhuma uma chave de ouro para o final dos Beatles. E é justamente nele que George surge com duas de suas melhores composições até então.
‘Something’, uma balada romântica que sobreviveria ao teste do tempo e ‘Here Comes the Sun’, com solos fantásticos de violão, sem falar nos vocais de George, fez todo mundo repensar a participação de George na banda. Ali, no final de uma era ele mostrava que tinha vindo pra ficar!


 Ao mesmo tempo que trabalhava nos projetos dos Beatles, e lia muito sobre a cultura oriental, George começava a dar os primeiros passos da carreira-solo. Após compor a trilha sonora do filme ‘Wonderwall’, ele participa de uma turnê com a banda de Delaney & Bonnie pelos EUA. Ainda em 69 compõe música experimental com sintetizadores e lança o disco ‘Eletronic Sound’.

Em 1970 com a separação dos Beatles consumada, George finalmente tem tempo e espaço para compor e terminar suas canções que haviam sido deixadas de lado. Em sua residência campestre de Friar Park onde havia se instalado com sua mulher Pattie, ele começa a trabalhar naquele que ao final do ano seria considerado um dos melhores álbuns de um ex-Beatle.
Requisitando a ajuda de músicos de primeira linha como Clapton, Bob Dylan, Dave Mason, Ringo Starr, Jim Gordon e Billy Preston, além da produção de Phil Spector, o que se viu foi um trabalho grandioso.
Harrison comentou depois do lançamento de ‘All Things Must Pass’, que estava com músicas demais na sua cabeça e que tinha que colocá-las para fora. O jeito foi fazer um álbum triplo. O primeiro da história!              
Apesar do forte apelo espiritual do disco, George conseguiu aquilo que talvez poucos esperassem dele: o sucesso de público e de crítica.
O grande momento dos trabalhos foi o hino ‘My Sweet Lord’, que seria eternamente ligada ao seu criador. Canções como ‘Isn’t It a Pity’, ‘Behind that Locked Door’ e o rockão ‘What Is Life’ se impõe por si só, e são testemunhas inegáveis do progresso de Harrison como compositor.

Depois deste início arrasador de carreira-solo, Harrison se envolveu com projetos dos artistas da Apple, começando a produzir trabalhos para a banda Badfinger e Jackie Lomax.
 Durante o ano de 1971, ainda envolvido em processos pendentes da separação dos Beatles, e trabalhando no álbum ‘Straight Up’ do Badfinger, George recebe a visita de seu amigo Ravi Shankar com péssimas notícias. Bangladesh, país vizinho a Índia havia sofrido enorme devastação em 1970 por causa de um ciclone e chuvas torrenciais, além de uma guerra civil que estava em pleno curso, obrigando milhares de desabrigados a procurar auxílio nos países vizinhos. 


Harrison parte para Nova Iorque e, recorrendo a ajuda de vários músicos famosos, protagoniza em 01º de agosto, o primeiro concerto beneficente da história. A resposta do público foi fantástica, com a participação de mais de 40 mil pessoas, e toda a renda sendo revertida para a carente população de Bangladesh.
George fez uma canção especialmente para o evento, também chamada ‘Bangladesh’, e posteriormente um álbum e um DVD do concerto seriam lançados, com toda sua renda até hoje sendo enviada para uma fundação que George criou juntamente com a UNICEF.
Aos poucos, George foi se envolvendo em projetos mais caseiros, deixando a música um pouco de lado. Em sua casa em Friar Park, ele leva uma vida tranqüila ao lado de sua esposa Pattie, que infelizmente não pode ter filhos. Este talvez tenha sido o motivo de algumas discussões do casal. Nesta época Eric Clapton, passou a ser um hóspede contínuo da casa, e logo deixaria claro sua paixão por Pattie.
Seguindo em frente, George lança em 1973 o álbum ‘Living in the Material World’, considerado por muitos críticos, um dos melhores trabalhos de rock do ano. ‘Give Me Love’, single extraído do álbum fez enorme sucesso.

Em 1974, o casal Harrison se separa, e Pattie vai viver com Clapton. Nesse mesmo ano George faz sua única turnê solo nos EUA. As apresentações aguardadas com grande expectativa pelos fãs, foram um fracasso. Harrison queria basicamente apresentar as canções de sua carreira solo. Quando a galera começou a exigir ás músicas dos tempos dos Beatles, George perdeu a paciência. Ele começou a apresentá-las com os arranjos totalmente modificados, entrando em conflito com o público ansioso por ouvi-lo. Além disso, um problema crônico nas cordas vocais, impedia George de dar o melhor de si como cantor.
O resultado foi que Harrison nunca mais iria se comprometer com novas turnês.


Esta fase dos problemas vocais coincide com o disco ‘Dark Horse’, o mesmo nome da nova companhia de gravações de George. Apesar de alguns bons momentos, notadamente com ‘Simply Shady’ e ‘So Sad’, o álbum não deslancha, em grande parte por culpa da voz rouca de Harrison.
Nem tudo é tristeza para George, porém. Durante as gravações ele conhece a secretária da Apple, a mexicana Olivia Arias, com quem começa um relacionamento.

Nos últimos anos da década de 70, George lançaria outros trabalhos desiguais. ‘Extra Texture’, apesar do hit ‘You’, foi uma fraca despedida da Apple.
Com ‘Thirty-Three and 1/3’, Harrison pareceu reanimado, e obteve sucesso com a canção e o clip de ‘This Song’. O clip era uma paródia comentando uma suposta prisão de George pelo plágio da canção ‘My Sweet Lord’ de que fora acusado.    
Em agosto de 78, George fica muito feliz com o nascimento de seu filho com Olivia, chamado Dhani.
Para encerrar a década, ele lança em 79 o álbum ‘George Harrison’, outro trabalho mediano que continha a sua homenagem à Fórmula 1 – George era um grande fã de corridas – com a música ‘Faster’. Ele chegou a visitar o Brasil em fevereiro daquele ano para acompanhar o GP de Interlagos. Sendo portanto, o primeiro Beatle a pisar em terras tupiniquins.

Durante os últimos anos, George vinha escrevendo uma auto-biografia. Ela acabaria sendo publicada em 1980, com o título de ‘I Me Mine’, uma de suas músicas dos tempos dos Beatles.
Este livro, inicialmente publicado em edição limitadíssima e a peso de ouro, foi pivô de um desentendimento de George com John Lennon, que não gostou de ver seu nome citado pouquíssimas vezes. De fato, todos os ex-Beatles, quase não apareciam, e o livro nem poderia ser considerado uma auto-biografia séria, pois consistia em sua maior parte, das letras originais da canções de Harrison. Não houve tempo para explicações. Lennon seria assassinado no final do ano, e George ficaria terrívelmente abalado com a situação.

Nos anos 80 após ter lançado dois álbuns sem grande expressão, ‘Somewhere in England’ e ‘Gone Troppo’, Harrison deu mais um tempo na música.

 Já fazia algum tempo que ele vinha curtindo sua vida familiar, viajando com Olivia e o pequeno Dhani, e agora ele queria desfrutar pra valer de toda essa privacidade que lhe era negada no tempo dos Beatles.
 Além da meditação, sua outra paixão passou a ser a jardinagem. George começou a fazer cursos avançados sobre o assunto, e referia-se a si mesmo, como ‘apenas um jardineiro’ e músico aposentado. O único passatempo que lembrava ainda os velhos tempos era o dedilhar de ukelêles ( uma espécie de cavaquinho ), que George colecionava as centenas.
Quando em 1987 os rumores de um novo disco de Harrison surgiram, todos ficaram surpresos. Finalmente ele deixava o retiro e voltava à ativa. E o fez em grande estilo. O álbum ‘Cloud Nine’ lançado no final daquele ano, foi nada menos que um dos melhores álbuns de um ex-Beatle em muitos anos. Canções como ‘When We Was Fab’ – surpreendentemente recordando os tempos da melhor banda do mundo -, ‘This Is Love’, ‘Just for Today’, além da canção-título, estão entre as melhores obras de Harrison. Arrematando o álbum, a cover de ‘Got My Mind Set on You’, bateu recordes de venda e chegou ao nº 1 nos EUA.


Satisfeito com o sucesso do álbum e a volta por cima, mas ainda em dúvida sobre a continuação de sua carreira na música, George encontrou-se com os amigos Bob Dylan e Tom Petty. Desse encontro surgiu a idéia de uma reunião para tocarem num estúdio caseiro. Com o acréscimo de Roy Orbinson e Jeff Lynne, estava formado o super-grupo Travelling Wilburys. Esta banda, lançaria dois trabalhos nos anos seguintes, com enorme sucesso.
Era tudo que George queria, ser apenas mais um músico num grupo. Ele nunca gostara de ser o centro das atenções.
Infelizmente, a morte de Roy Orbinson, e o desejo de Dylan de continuar a carreira-solo fez com que a banda se separasse.
Em 1991 o amigo Eric Clapton insistiu para que George o acompanhasse numa turnê pelo Japão. Ainda receoso das apresentações ao vivo, Harrison foi persuadido pela fama do povo japonês, que era um dos mais fanáticos por Beatles em todo o mundo, e considerado pelos músicos, a audiência mais bem educada do planeta.
Finalmente, o ex-Beatle se apresentou para os enlouquecidos fãs japoneses em shows que fizeram história. Apresentando praticamente todas suas canções antigas dos Beatles, juntamente com as mais recentes, George foi ovacionado pelas multidões japonesas.
‘O álbum duplo ‘Live in Japan’, lançado no ano seguinte, dá uma pequena amostra de como foram emocionantes as apresentações de Harrison com a banda de Clapton.

Nos anos 70 e 80 George havia se envolvido com cinema. Ele fundara a ‘Handmade Films’, empresa que participara de várias produções do grupo Monty Python além de ‘Shangai Surprise’ com Madonna e ‘Mona Lisa’ com a participação de Bob Hoskins - entre outros filmes de sucesso.  Quando a produtora entrou em crise, as preocupações financeiras de Harrison vieram à tona.
Nesse momento, seu ex-parceiro Paul McCartney surgiu com a ideia de um revival dos Beatles para os jovens dos anos 90.
Porque os próprios Beatles não poderiam contar sua história?
Ringo Starr e George toparam o projeto intitulado ‘Beatles Anthology’, que incluiu 3 CDs duplos, uma caixa com 5 DVDs e um enorme livro em que os quatro – John através de suas entrevistas – contavam sua versão da saga beatlemaníaca.
Após este novo fenômeno de vendas, as finanças de George se estabilizaram e ele pode retornar aos seus afazeres de jardineiro, deixando novamente a música de lado.  
Quando tudo parecia tranqüilo para a família Harrison, em 1998 George é diagnosticado com um câncer de garganta.
Infelizmente a doença não respondeu ao tratamento.
Em 2000, George ainda participaria do relançamento remasterizado de ‘All Things Must Pass’, seu primeiro álbum solo.
Animado com o resultado, ele volta a gravar, desta vez recrutando a ajuda de seu filho Dhani, então com 21 anos.
Não houve tempo para as conclusões dos trabalhos.
Em 29 de novembro de 2001, George nos deixou.

Suas últimas gravações, finalizadas por seu filho Dhani e Jeff Lynne são lançadas em 2002 em seu álbum póstumo ‘Brainwashed’, no qual as canções ‘Stuck Inside a Cloud’ e ‘Rising Sun’ resumem, com seus elegantes solos de slide e o vocal inconfundível, a obra inesquecível de George Harrison!  


3 comentários:

Debbie disse...

Texto bonito. Homenagem bonita!

Eduardo Lenz de Macedo disse...

Obrigado, Debora! Depois ,me dei conta que antecipei um pouco. Nunca penso em termos de 'homenagem', é só uma lembrança pra algumas pessoas que gostam de música, não esquecerem de um cara muito importante como o George, neste caso! Valeu!!

Debbie disse...

Bem, pra mim não deixa de ser uma 'homenagem', hehe...