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sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Saudade de Neruda!


"Ao pé dos vulcões, junto aos ventisqueiros, entre os grandes lagos, o fragrante, o silencioso, o emaranhado bosque chileno... Os pés afundam na folhagem morta, um ramo quebradiço crepita, os gigantescos raulíes levantam sua estatura encrespada, um pássaro da selva fria atravessa o ar, esvoaça e se detém entre as ramagens sombrias -- e logo, de seu esconderijo, soa como um oboé... O aroma selvagem do loureiro e o aroma obscuro do boldo me penetram pelas narinas até a alma... O cipreste das Guaitecas intercepta meus passos... É um mundo vertical: uma nação de pássaros, uma multidão de folhas... Tropeço em uma pedra, escarvo a cavidade descoberta, e uma aranha imensa de pelo vermelho me olha fixamente, imóvel, grande como um caranguejo. Um besouro dourado me lança sua emanação mefítica enquanto desaparece como um relâmpago seu radiante arco-íris... Ao passar, atravesso um bosque de fetos muito mais altos do que eu; caem no meu rosto sessenta lágrimas de seus verdes olhos frios e atrás de mim ficam por muito tempo agitando seus leques... Um tronco podre, que tesouro!... Fungos negros e azuis deram-lhe orelhas, plantas parasitas vermelhas cobriram-no de rubis, outras plantas preguiçosas emprestaram-lhe seus filamentos, e brota, veloz, uma cobra de suas entranhas podres como uma emanação, como se do tronco morto lhe escapasse a alma... Mais adiante cada árvore se separou de suas semelhantes... Erguem-se sobre a alfombra da selva secreta, e cada uma de suas folhas, linear, encrespada, ramosa, lanceolada, tem um estilo diferente, como cortada por uma tesoura de movimentos infinitos... Um barranco; a água transparente desliza sobre o granito e o jaspe... Voa uma mariposa pura como um limão, dançando entre a água e a luz... A meu lado as calceolárias infinitas me saúdam com suas cabecinhas amarelas... Lá no alto, como gotas arteriais da selva mágica, vergam-se os copihues vermelhos (Lapagéria Rósea)... O copihue vermelho é a flor do sangue, o copihue branco é a flor da neve... Num tremor de folhas, a velocidade de uma raposa atravessa o silêncio, mas o silêncio é a lei destas folhagens... Apenas o grito distante de um animal confuso... A interseção penetrante de um pássaro escondido... O universo vegetal apenas sussurra até que uma tempestade ponha em ação toda a música terrestre.
         Quem não conhece o bosque chileno não conhece este planeta.
          Daquelas terras, daquele barro, daquele silêncio, eu saí a andar, a cantar pelo mundo".*


Pablo Neruda - 12/07/1904 - 23/09/1973.   'Confieso que he vivido'.*

Neruda se foi na primavera, há 38 anos!



'Puedo escribir los versos mas tristes esta noche...'


Um comentário:

Debbie disse...

Que bonitos, texto e poema! Bela lembrança e homenagem!