Um grupo de garotos brinca em um parque à beira do East River, em
Nova York, até que um deles ataca outro com um galho. A sequência
inicial é a única rodada ao ar livre em Carnage, o novo filme
de Roman Polanski, grande atração desta quinta-feira, segundo dia de
competição do Festival de Veneza. O drama cômico que se segue, durante o
qual se discutem as causas e consequências do ato de violência
juvenil, se passa nos limites do apartamento dos pais de um dos jovens,
exatamente como descrito na peça original de Yasmina Reza (Deus da carnificina),
que serviu de base para o novo longa do diretor franco-polonês,
recebido com aplausos calorosos pela plateia de jornalistas.
O filme de Polanski preserva a estrutura e o tom
teatral do texto da premiada escritora e dramaturga francesa, já
encenado em diversas partes do mundo. Ao optar por uma adaptação mais
próxima do literal, o diretor transforma o apartamento novaiorquino em
palco para as deliciosas performances de seus quatro protagonistas, Kate
Winslet, Jodie Foster, John C. Reilly e Christoph Waltz.
Embora ambientado no bairro americano, Carnage
foi rodado em Paris, já que Polanski está impedido de entrar nos EUA e
de circular livremente pela Europa, porque ainda responde à acusação
de estuprar uma adolescente em Los Angeles, em 1977 — em 2009, o autor
de O escritor fantasma foi preso a caminho de um festival de cinema na Suíça e aguardou a sentença sobre sua extradição em prisão domiciliar.
A sensação de assistir a uma peça filmada é
confirmada por seus intérpretes, que defenderam o filme em Veneza ao
lado de Yasmina e Alexandre Desplat, compositor da trilha sonora, sem a
presença do diretor.
"Era exatamente como se estivéssemos fazendo uma
peça. Ensaiávamos um pouco antes de fazer as cenas do dia e toda a
história era filmada em ordem cronológica. Acho que nenhum de nós havia
feito algo parecido antes", contou Kate, com entusiasmo. "Eu já havia
assisto à peça da Yasmina na Broadway. Só fiquei preocupada se eu faria
a minha personagem tão engraçada quanto a que vi."
"Nós trabalhamos juntos em diferentes aspectos dos
ensaios e das filmagens, sempre mantendo o jeito de interpretação de
cada um. Tudo era repassado e revisto todos os dias. Acho que
poderíamos ir direto do set a um teatro", brincou Waltz.
A trama reúne duas famílias de classe média alta que
revelam suas contradições e preconceitos enquanto tentam chegar a um
acordo sobre a briga de seus filhos. De um lado estão o advogado Alan
(Waltz) e sua mulher, Nancy (Kate), pais do agressor; do outro, a
escritora liberal Penelope (Jodie) e o marido, Michael (Reilly), um
vendedor de peças e engrenagens domésticas. Ao longo de quase uma hora e
meia, a conversa civilizada cede lugar a acusações, revelando
hipocrisias de ambas as partes. O desfecho é menos pessimista do que o
descrito na peça de Yasmina.
"Roman, que trabalhou na adaptação comigo, queria um final que desse alguma esperança às gerações futuras", confirmou ela.
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