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quarta-feira, 19 de outubro de 2011

TESS of the D'Urbervilles


 Em 1969, quando o cineasta Roman Polanski se despediu em Londres de sua mulher Sharon Tate, que estava voltando para a América para dar a luz ao seu primeiro filho, ele notou que Sharon havia esquecido algo no carro. Era um livro de Thomas Hardy, chamado 'Tess of the D'Urbervilles'.
Polanski guardou consigo aquele romance, e quando poucos meses depois sua esposa foi assassinada, ainda abalado pela tragédia, ele passou a lê-lo seguidamente, a ponto de sabê-lo quase de cor.

Não foi surpresa portanto quando quase uma década depois Polanski conseguiu filmá-lo.

Nas palavras de Polanski: "Tess é a história da inocência traída num mundo onde o comportamento humano é governado por barreiras de classe e preconceito social. É também um estudo da casualidade. Todos os males na vida de Tess são produtos fortuitos das pequenas coincidências - mas importantes - que moldam nosso destino. Se não tivesse havido um encontro casual entre seu pai e um pároco que lhe diz que ele tinha sangue aristocrático nas veias, não haveria tragédia."

O filme se revelou de feitura dificílima, com problemas de produção, de logística e de cenários. Polanski prossegue: "Era muito importante achar o cenário apropriado, um equivalente no século XX da Dorset do século XIX de Hardy. Teríamos que assinalar a passagem do tempo e a mudança na própria Tess por meio de uma mudança visível, quase palpável, das estações. Depois de escolhido o local de filmagem rural, deveríamos filmar por um ano afora, começando no início da primavera, atravessando o auge do verão até as profundezas do inverno. Essa programação longa e pouco usual resultaria inevitavelmente num filme muito caro."
Para a personagem principal, Roman trouxe uma amiga que ele conhecia já fazia algum tempo, mas completamente desconhecida do grande público: Nastassja Kinski, talvez somente conhecida por ser filha do veterano ator Klaus Kinski. Os outros papéis de destaque couberam a Peter Firth (Angel) e Leigh Lawson (Alec). O diretor de fotografia foi Geoffrey Unsworth (Superman), que morreria durante as filmagens.

"Em qualquer produção o 1º dia de filmagem marca o estado de espírito e o andamento de todo o processo. É muito importante achar a combinação certa de velocidade e precisão, de humor e entusiasmo. A 7 de agosto, o 1º dia, levantei-me antes da aurora, abri a janela do quarto do hotel e descobri que estava chovendo torrencialmente.
Choveu o dia todo. A cena a ser filmada era aquela na qual Alec dá a Tess um morango para comer (cena  representada na primeira foto), num brilhante dia de verão. Assim, tivemos que levantar um toldo de mais de cem metros, para manter a chuva longe do jardim de rosas, da câmera e dos atores. 
Apesar do tempo, a cena do jardim de rosas aparece com uma qualidade luminosa e mágica de meio de verão, que testemunha a extraordinária habilidade de Geoffrey Unsworth." 


Roman continua: "Por TESS ter levado tanto tempo para ser filmado nossa equipe desenvolveu uma existência comunitária e um ritmo a seu próprio modo, com nascimentos, mortes, casos de amor, divórcios, momentos de alta comédia e de tragédia profunda. Nós éramos uma festa móvel, que viajava desde a Normandia no meio do verão, através do outono e do inverno na Bretanha, e de volta, novamente, a lugares que nos eram familiares há meses.
Alguma coisa da atmosfera idílica daqueles meses pode muito bem estar refletida no próprio filme. Para mim, vindo depois da prisão em Chino, isso constituiu um episódio particularmente importante em minha vida e uma experiência extraordinariamente purificadora."

TESS demorou mais de 1 ano para encontrar distribuidor nos EUA, onde foi o filme mais calorosamente recebido da carreira de Polanski até então, fez sucesso de público e crítica, com várias indicações ao OSCAR.
Alguns interpretaram os infortúnios de Tess como um pedido público de desculpas de Polanski por sua 'transgressão' em Los Angeles, - o caso de assédio sexual ilegal que até hoje o atormenta - mas ele nunca admitiu isso. Ele não podia conceber que ele vitimasse deliberadamente uma mulher. 
Sua mãe e Sharon, as duas mulheres que mais amou na vida, foram vítimas de atacantes intencionais ( a mãe pelos nazistas e Sharon pelos assassinos de Manson), e suas personagens mais agradáveis são sempre suas vítimas, como Carol em "Repulsa ao Sexo" e Rosemary (O Bebê de Rosemary) ou Evelyn Mulwray em 'Chinatown'.

Com a dificuldade de achar distribuidores para TESS, Polanski pensou em se aposentar. Ele se sentia cansado e imaginava que não valia mais a pena perder anos de sua vida filmando. Ele se concentrou em atuar como ator e dirigir óperas. Roman representou Mozart durante vários anos em 'Amadeus' nos palcos.
Enquanto isso, ele encontrou tempo tb para escrever sua autobiografia, 'Roman'(1984).
 
Talvez toda a essência do livro de Hardy não tenha sido assimilada por Polanski, mas sem dúvida este trabalho, com suas reconstruções minuciosas e figurinos perfeitos, merecem um lugar especial na filmografia do mestre.


2 comentários:

Aguinaldo Medici Severino disse...

maravilha de texto meu caro macedo.
abraços.

Eduardo Lenz de Macedo disse...

Grande Guina.O que o POlanski comenta é de sua biografia, que aliás é muito boa. Abraços.