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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Abbey Road - 44 anos

Em 2009, quando dos 40 anos do álbum 'Abbey Road', escrevi este texto para um jornal. Ele acabou sendo publicado no livro 'Alto & Bom Som - Ruídos, Chiados e Pinceladas Musicais'! Sempre é bom lembrar do melhor álbum da melhor banda do planeta!!    


                        



                                                      Abbey Road - O final anunciado
          
Após o término das gravações do ‘Álbum Branco’, e com todas as divergências ocorridas, poucos imaginavam uma nova reunião dos Beatles.

John Lennon, desde a separação de sua primeira esposa, Cynthia, estava mais preocupado em passar todos os momentos de sua vida ao lado de Yoko Ono. Isso incluía levá-la aos estúdios e até ao banheiro masculino, se isso fosse necessário, para não interromper um diálogo.

George Harrison, conhecido como o ‘Beatle quieto’, não agüentava mais o pouco espaço que ele tinha dentro da banda e estava muito mais interessado em estudos religiosos.

Ringo Starr era chamado apenas quando sua presença no estúdio era absolutamente necessária como baterista e, mesmo assim, muitas vezes foi privado de suas funções no ‘Álbum Branco’ por Paul McCartney, sempre zeloso com suas músicas, e querendo ele mesmo tocar a bateria.

McCartney, por sua vez, achava que a banda tinha uma saída e bolou uma volta às raízes! Este projeto, que ficaria conhecido como ‘Get Back’ e depois finalmente, ‘Let It Be’, foi iniciado em janeiro de 1969, com filmagens dos Beatles ensaiando e discutindo, não necessariamente nessa ordem. A coisa toda virou um caos e, após novas discussões, o projeto foi abandonado, não sem antes um show de despedida no telhado da Apple, em 30 de janeiro!
O filme e o álbum “Let It Be” só veriam a luz do dia em 1970 - ainda assim com as gravações mutiladas por Phil Spector - quando a banda já tinha se separado.


Em abril, John e Paul foram avisados de que os negócios não iam bem. A empresa Apple, que eles tinham criado com tanto carinho para cuidar dos interesses dos Beatles, estava dando prejuízo.
John, apoiado por George e Ringo, contratou Allen Klein, ex- empresário dos Rolling Stones, para cuidar da Apple. Paul votou contra, ele preferia seu sogro, Lee Eastman. Eles só concordavam num assunto: os Beatles precisavam urgentemente gravar e lançar um álbum ainda naquele ano para amenizar as perdas.

Paul, George e Ringo começam imediatamente os trabalhos. John, só após alguns dias devido a um grave acidente de carro, no qual quase morreu, junto com Yoko.

Os Beatles tinham a sensação de que aquele poderia ser seu último trabalho e resolvem recrutar o velho amigo e produtor George Martin, que não havia participado do projeto da volta às raízes.

A primeira faixa é a rascante Come Together de John, marcada por um baixo magistralmente tocado por McCartney e um solo de guitarra bluesy de George.

Harrison comparece com uma de suas mais belas criações, a sensível Something, que emplacaria um 1º lugar em single e que, mais tarde, geraria milhares de covers, inclusive de Frank Sinatra, que se referia a ela como “a melhor canção de Lennon & McCartney”!
Paul, que tinha se tornado o compositor mais prolífico da banda, emenda duas músicas: Maxwell’s Silver Hammer e Oh! Darling. A primeira foi um primoroso trabalho de produção e uma das canções mais perfeitas dos Beatles, tendo eles trabalhado dias a fio nessa composição.
Oh! Darling apresenta um dos vocais mais fortes de Paul em toda sua trajetória Beatle. O detalhe é que ele chegava bem cedo ao estúdio todas as manhãs, para que sua voz apresentasse uma certa crueza, coisa que ele não poderia repetir em outras horas do dia!
Ringo tem a oportunidade de mostrar seu talento vocal em Octopus’s Garden, um belo trabalho feito com a ajuda do amigo George.
John encerra o lado A com a visceral I Want You (She’s So Heavy), que foi, na verdade, duas músicas diferentes reunidas. O arranjo lembra o rock progressivo que faria história na década seguinte.


George inaugura o lado B com outra balada lindíssima, a clássica Here Comes The Sun, composta no jardim da casa de seu amigo Eric Clapton. Harrison, cada dia melhor como compositor, nos dá uma amostra do que seria seu trabalho solo.
Because, de Lennon, surgiu de uma forma estranha. Ele conta que Yoko estava tocando a Sonata ao Luar, de Beethoven, ao piano. John então pediu para que Yoko tocasse os acordes ao contrário, surge assim a bela melodia dessa canção que conta com os vocais de John, Paul e George. 

Paul e John, nessa época, tinham vários fragmentos de canções inacabadas. Paul teve a ideia de amarrá-las todas e fazer uma espécie de ‘medley’.  Era algo inovador e que surpreendeu quem estava acostumado com um álbum tradicional.
Este medley começa com You Never Give Me Your Money, em que Paul faz um desabafo sobre os problemas financeiros da Apple.
Seguem-se três composições de Lennon, Sun King, novamente com vocais do trio, Mean Mr. Mustard, do tempo da meditação na Índia, e Polythene Pam.
McCartney surge com She Came in Through the Bathroom Window, uma de suas grandes composições no álbum, onde ele descreve a invasão de sua casa por uma fã através da janela do banheiro!
Paul teve a inspiração para Golden Slumbers, quando ouviu a enteada de seu pai, Ruth, de 8 anos, tocar essa antiga composição inglesa ao piano. Paul, como todos os Beatles, não sabia ler música, então ele resolveu aproveitar a letra, mas compor sua própria melodia para esta canção. Ela emenda em Carry That Weight, um vigoroso esforço conjunto da banda.
The End não poderia ser mais apropriada para a última música do álbum e da banda. Com o clássico verso “And in the end the love you take is equal to the love you make”(no final o amor que você recebe é igual ao amor que você  oferece), esta brilhante composição de McCartney nos brinda com um pequeno solo de bateria de Ringo e três solos de guitarra, tocados ao vivo por Paul, George e John, nessa ordem!


Após a arte da capa multicolorida e a homenagem aos seus ídolos de “Sgt. Pepper’s” e a simplicidade minimalista da capa do “Álbum Branco”, Paul teve a ideia de também homenagear os estúdios de Abbey Road onde eles fizeram história. Assim no dia 8 de agosto, eles simplesmente resolvem ser clicados por Iain MacMillan atravessando a rua em frente ao estúdio. A foto foi muito imitada e parodiada por outros artistas e, até hoje em dia, fãs do mundo inteiro fazem peregrinações para serem fotografados atravessando o mesmo local em Londres.

Estava quase terminado, provavelmente o melhor disco que a melhor banda do planeta lançou, mas havia tempo para uma piadinha de Paul em homenagem a Rainha, Her Majesty!

Lançado em setembro de 1969, “Abbey Road” liderou as paradas nos dois lados do Atlântico e se tornou o maior sucesso comercial da banda!

Mesmo quatro décadas depois muita gente ainda discute o que causou o final dos Beatles. Teria sido a constante presença de Yoko Ono nas gravações e a falta de interesse de John na banda? Os negócios que iam mal teriam tido influência decisiva no final da banda? A falta de espaço para George nos álbuns terminou com o sonho? As atitudes autoritárias de McCartney estariam cobrando seu preço?
Pelas declarações dos Beatles, podemos considerar que talvez tenha sido um pouco disto tudo, mas não era só isso.
A verdade é que os Beatles cresceram! Eles não eram mais aqueles garotos ingênuos cantando ‘yeah yeah yeah’, e como nenhuma outra banda antes ou depois resolveram terminar com o grupo no auge do sucesso.

John passaria a fazer campanha pela paz mundial e lançaria duas obras-primas nos próximos anos, “John Lennon/Plastic Ono Band” e “Imagine”. Em seguida partiria de mudança para os EUA em 1971, para fixar residência em Nova Iorque e se tornar pai novamente. Em 1975, deixou a carreira de lado para cuidar do filho. Quando retornou, em 1980, com “Double Fantasy” seria assassinado na porta de casa.


George lança em dezembro de 1970, aquele que para muitos é o melhor trabalho de um ex-Beatle, o álbum triplo “All Things Must Pass”, contendo várias músicas que ele não conseguia aproveitar na sua ex-banda. George se separaria de sua primeira mulher, Pattie, em 1973, e casaria com a mexicana Olivia Arias, que lhe daria seu único filho, Dhani, em 1978. No início dos anos 90, George se torna ainda mais introspectivo e raramente se ouve falar dele. Ele é vitimado pelo câncer em novembro de 2001. Um novo trabalho seu apareceria apenas postumamente em 2002, chamado “Brainwashed”.

Ringo, após a separação, tentou seguir carreira no cinema e participou de alguns filmes com relativo sucesso. Em 1973, ele lança seu melhor trabalho, “Ringo”, com as participações de John, George e Paul. Ringo também se separaria de sua primeira mulher, Maureen, e se casaria com a atriz Barbara Bach. Ele continua lançando álbuns e fazendo turnês com a ‘All-Starr Band’.

Paul foi provavelmente o Beatle que mais sofreu com a separação. Ele comentou que tocar num conjunto era “tudo o que ele sabia fazer” e entrou em depressão com o final da banda. Ele lança trabalhos irregulares no início dos anos 70, até se consagrar com “Band on the Run”, em 1974.
Em 1976, faz uma turnê vitoriosa pelos EUA com sua nova banda, Wings. Após a morte de John lança outro fantástico álbum, “Tug of War”. Depois de excursões mundiais apoteóticas, em 1990 e 1993, Paul perde a esposa Linda para o câncer, em 1998.
Ele foi o ex-Beatle que obteve maior sucesso comercial. Em termos de talento como cantor, músico e compositor, além dos milhões de álbuns vendidos, é considerado o artista mais bem sucedido da história da música.